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*Publicado na Revista "Por Trás da Palavra" do CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) de Novembro/Dezembro de 2017, Ano 35, nº 332.
Se existe um exemplo emblemático de toda a crise política,
econômica e social no Brasil, de fato é o Rio de Janeiro (tanto a
cidade quanto o Estado). O Rio de Janeiro viveu recentemente a
euforia da Copa do Mundo (2014) e das Olimpíadas (2016), grandes
eventos internacionais que porém pouco ou nenhum benefício deixaram
para o seu povo, mas deixaram muitas mazelas como legado contra o
povo mais humilde: “Os justos levam em conta os direitos dos
pobres, mas os ímpios nem se importam com isso.” (Provérbios
29:7).
No preparativo para tais eventos já era nítido a quem os governos
estavam servindo e que não era ao povo mais humilde e sim ao capital
especulativo. De fato não é possível servir a Deus e ao dinheiro
(Lucas 16:13) e nossos governantes, bem como as elites que os
sustentam, não tardaram a escolher o seu lado. A política de
remoções de comunidades carentes para abrir espaço para a
especulação imobiliária, que parecia sepultada na tenebrosa era
Lacerda, foi a tônica dos preparativos com várias comunidades
sofrendo com os despejos: Vila Autódromo, Asa Branca, …
A especulação imobiliária, o problema da concentração das terras
e casas nas mãos de poucas pessoas, que acabam empurrando os mais
pobres para localidades mais distantes visando atender os interesses
das classes privilegiadas, já era denunciada pelos profetas
bíblicos: “Ai dos que ajuntam casas e mais casas, dos que
acrescentam um campo a outro, até que não haja mais onde alguém
possa erguer sua casa, e eles se tornem os senhores absolutos da
terra!” (Isaías 5:8).
Tanto a remoção não privilegiava o povo, como não era necessária,
que com muita luta alguns moradores da Vila Autódromo conseguiram
continuar a morar no mesmo local. Igualmente, nota-se que não era
apenas por conta dos grandes eventos, já que após os mesmos, o
fantasma das remoções retorna quando a prefeitura ameaça remover
os moradores da comunidade do Rio das Pedras (comunidade humilde que
fica ao lado áreas nobres da capital fluminense como o Itanhangá,
Alto da Boa Vista e Barra da Tijuca).
Falando em lutas, desde as jornadas de protesto em 2013, passando
pela luta dos moradores contra as remoções, a luta dos servidores
públicos para receberem os seus salários, as lutas contra os
leilões do pré-sal e tantas outras, a resposta das autoridades é
sempre a mesma: repressão. A violência contra o povo se viu em um
nível alarmante, protestos pacíficos foram reprimidos com um
sadismo assustador, a violência era a arma para tentar calar o povo
(sempre foi, não é atoa que seguimos o Cristo crucificado com seus
discípulos martirizados pelo grande Império), não é atoa que diz
a Bíblia: “Como um leão que ruge ou um urso feroz é o ímpio que
governa um povo necessitado.” (Provérbios 28:15).
Como resultado do pós-olimpíadas, além de obras faraônicas
subaproveitadas como a vila dos atletas na Ilha Pura (que continua
sem uso), o Centro Olímpico subaproveitado, sistemas de transportes
mal planejados (ou melhor, planejados de acordo com os interesses das
empresas e não com os interesses do povo), vieram as notícias que
todos já sabíamos: os esquemas de corrupção (alguns ligados a
realização dos eventos) e os gastos exorbitantes com estruturas
desnecessárias levou a falência econômica do Estado do Rio de
Janeiro e uma forte crise na capital do mesmo.
Com a crise, os governos novamente optaram por cortar gastos, porém
não fizeram o corte no uso indevido do dinheiro público, e sim
resolveram realizar cortes nos repasses para a saúde, educação e
outras áreas, chegando a cortar o salário dos servidores estaduais
que estão a meses sem receber o que lhes era devido. Meses sem
salário, sem o sustento, levando a muitos servidores passarem fome,
serem despejados e passarem por várias outras situações terríveis,
alguns inclusive morreram nesse período por problemas de saúde que
possivelmente foram agravados por todo o estresse e necessidades
gerados pela falta do sustento mais elementar para si e para os seus,
como no provérbio bíblico: “Quando os justos governam, alegra-se
o povo; mas quando o ímpio domina, o povo geme” (Provérbios
29:2).
Enquanto os servidores amargam meses sem receber o seu sustento e o
povo amarga a falta de serviços públicos dos mais básicos, o
Estado do Rio de Janeiro tem seus 3 últimos governadores presos por
envolvimento em escândalos de corrupção, vivendo vidas de luxo as
custas do sangue e do suor do povo de Deus, além deles secretários
e deputados se encontram na mesma situação (e olha que vários
colegas deputados continuaram tentando manter os corruptos livres,
enquanto mandavam a polícia para reprimir o povo que protestava
contra os absurdos), de fato, parece-nos que o apóstolo Tiago
escreveu para o nosso Estado e seus líderes:
“Ouçam
agora vocês, ricos opressores! Chorem e lamentem-se, tendo em vista
a miséria que lhes sobrevirá. A riqueza de vocês apodreceu, e as
traças corroeram as suas roupas. O ouro e a prata de vocês
enferrujaram, e a ferrugem deles testemunhará contra vocês e como
fogo lhes devorará a carne. Vocês acumularam bens nestes últimos
dias. Vejam, o salário dos trabalhadores que ceifaram os seus
campos, e que por vocês foi retido com fraude, está clamando contra
vocês. O lamento dos ceifeiros chegou aos ouvidos do Senhor dos
Exércitos. Vocês viveram luxuosamente na terra, desfrutando
prazeres, e fartaram-se de comida em dia de abate. Vocês têm
condenado e matado o justo, sem que ele ofereça resistência.”
(Tiago 5:1-6)
Como nas diversas crises relatadas nas Escrituras, que tiveram o
pecado e a maldade como origem, Deus levantou profetas no meio de seu
povo, Deus está nos chamando para denunciarmos tudo o que está
ocorrendo em nossa terra e com o nosso povo. Que Deus tenha
misericórdia de nós todos. Amém.
Por Professor Morôni Azevedo de Vasconcellos
Professor de geografia, teólogo, especialista em geografia do Brasil, mestre em educação e postulante ao ministério ordenado na Igreja Episcopal Anglicana do Brasil.
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