Thanos (Vingadores: Guerra Infinita): Um vilão (neo)malthusiano.

on sábado, 12 de maio de 2018
Recentemente pude ver o filme Vingadores: Guerra Infinita e percebi (não só como fã da Marvel) que o filme tem um grande potencial para ser trabalhado de forma educativa, especialmente por professores de geografia ao discutirem as teorias demográficas.

O grande vilão do filme se chama Thanos e ele deseja "salvar o universo" de uma forma bem equivocada: eliminando metade da população para reencontrar um suposto equilíbrio. Basicamente, Thanos veio de um planeta (Titan) que ele acredita que foi destruído pela falta de recursos para atender a toda a sua população.

O vilão Thanos

Por incrível que pareça, existiram (e existem) muitos Thanos na vida real. De certa forma, o primeiro deles foi Thomas Malthus que desenvolveu a chamada teoria malthusiana na qual considerava que a produção de alimentos crescia sempre em um ritmo menor do que a população conseguia crescer. Por exemplo:

Produção de Alimentos -> 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, ... (Progressão Aritmética)

População -> 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, ... (Progressão Geométrica)

Malthus entendia que as guerras, fome e pestes eram formas naturais de controle do crescimento populacional e a sua proposta para conter o suposto problema da super-população seria simplesmente a abstinência sexual dos mais pobres. Thanos ainda tenta ser "justo" em eliminar pobres e ricos igualmente, mas ainda vê na eliminação de pessoas a solução para o problema.

Proudhon sempre nos lembra a chocante frase de Malthus para apontar os problemas da economia política e muitas das soluções dadas para os problemas da pobreza (e o suposto problema populacional):
"... Um homem que nasce em um mundo já ocupado, se sua família não possui meios de alimentá-lo, ou se a sociedade não tem precisão de seu trabalho, este homem eu digo, não tem o menor direito de reclamar uma porção qualquer de alimento: ele está em demasia sobre a terra. No grande banquete da natureza, não há lugar para ele. A natureza ordena-lhe que se vá e não tardará ela mesma a colocar tal ordem em execução..." (Thomas Malthus em Ensaio sobre o Princípio da População, conforme citado pro Proudhon em Filosofia da Miséria).

O "vilão" Malthus.
Evidentemente, considerando os avanços tecnológicos e alguns outros progressos na sociedade, a produção de alimentos em si não é um problema nos dias atuais, o que não impede que os discípulos de Malthus tenham buscado atualizar a teoria do mestre, podemos dividir eles principalmente em dois grupos (essa divisão nem sempre é pacífica e geralmente ambos se confundem entre si): neomalthusianos (entendem que o problema é a escassez de recursos econômicos) e os ecomalthusianos (entendem que o problema é a escassez de recursos naturais).

Esses discípulos de Malthus parecem lembrar bastante o vilão Thanos, embora as soluções apresentadas por eles geralmente estejam focadas no planejamento familiar, podendo por vezes se apresentar de forma mais "bonita e civilizada" com a ideia de conscientização ou uma forma mais truculenta com a defesa de métodos abortivos, eliminação de pessoas tidas como "desnecessárias" e etc. Sempre que vemos alguém relacionando ideias como a do aborto ou a de não se desperdiçar recursos com prisioneiros e outras pessoas "desnecessárias", se a pessoa relacionar estas ideias com algum problema de excesso de pessoas no mundo e o quanto isso supostamente contribui para a fome/miséria/violência/colapso ambiental, então teremos um pensamento nitidamente neomalthusiano/ecomalthusiano.

Thanos tem sido considerado por muitos um vilão carismático, esse carisma não se dá tanto por algo do personagem em si, mas pelo simples fato de que o discurso (neo/eco) malthusiano está impregnado em nossa sociedade e portanto as pessoas começam a considerar que o vilão "tem alguma razão". Veja que Thanos se preocupa em conseguir as jóias do infinito não para achar meios de evitar qualquer possível escassez, aumentar a produção, proteger os recursos, ele apenas quer usar elas para a "solução fácil" de eliminar as pessoas que eram "desnecessárias".

Se houver alguma dúvida sobre a presença do discurso neomalthusiano na nossa sociedade, basta olharmos quantas pessoas ainda acreditam que o problema do mundo está em uma superpopulação (mesmo que em muitos países o crescimento vegetativo esteja caindo) e que seria ela a responsável por produzir a pobreza, desconsiderando ou subestimando a má distribuição de renda e ordem social vigente.

O discurso ambientalista atual está muitas vezes repleto de ecomalthusianismo ao achar que o pela crise ambiental é o excesso de pessoas e não apenas a forma como a sociedade se relaciona com os recursos naturais, explorando os mesmos de forma irracional. A influência malthusiana é tão grande que não é raro vermos pessoas que se consideram de esquerda ou socialistas reproduzindo o discurso neomalthusiano por mais que conflite com suas próprias teorias políticas e econômicas. Lembram que eu já apontei o fato de o anarquista/socialista Proudhon ter tecido críticas ao pensamento malthusiano.

Sim, vale a pena a utilização do filme Vingadores: Guerra Infinita com fins didáticos, servindo como possibilidade de refletirmos sobre os perigos do discurso malthusiano (ou discursos derivados), bem como para podermos usar como parâmetro comparativo para facilitar aos estudantes que identifiquem os argumentos centrais de um discurso demográfico:
Se um argumento estiver mais parecido com o pensamento de Thanos, provavelmente será uma retórica influenciada pelo pensamento (neo/eco)malthusiano, se o argumento analisado se parecer mais com a frase do Capitão América (repetida pelo Visão) no filme de "não negociamos vidas", então já teremos algo fora da influência malthusiana.


1 comentários:

Unknown disse...

Eu gostei de sua crítica. Pessoalmente devo dizer que um dos melhores elementos do filme foi o elenco. O meu favorito foi Peter Dinklage. Na verdade não sou muito fã do seu trabalho, mas no trailer da Meu Jantar com Hervé me surpreendeu. Acho que se consolidou como ator e conseguiu encantar ao espectador. Recomendo muito o filme, vi que também será um dos mais interessantes filmes de Jamie Dornan, é uma historia que vale a pena ver. Vou gostar muito deste filme pelo bom enredo e narrativa.

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